Considerações teórico-clínicas da terapia cognitivo-comportamental
Desde a revolução cognitiva ocorrida na psicologia na década de 60, diferentes teóricos ou psicoterapeutas passaram a incluir a cognição em seus trabalhos, segundo suas próprias perspectivas. Várias formas de psicoterapia que compartilham pressupostos comuns em relação à mediação da cognição, sua acessibilidade e influência sobre o comportamento passaram a ser consideradas como terapias cognitivo-comportamentais (Dobson & Block, 1988 cita Araújo, Shinohara 2002). Dentre elas, a Terapia Cognitiva de Aaron Beck, a Terapia Racional Emotiva Comportamental de Albert Ellis, a Psicoterapia Estrutural de Guidano e Liotti, entre outras, têm se destacado significantemente ao longo dos anos (Araújo, Shinohara 2002).
Artigos de variados autores (Hawton, Salkoviskis, Kirk & Klark, 1989; Ellis, 2001; Freeman, 2001; Rangé, 2001 cita Araújo, Shinohara 2002) usam o termo Terapia Cognitivo-Comporta-mental para se referirem a cada uma delas ou de forma geral.
A característica mais marcante está na ênfase dada aos processos cognitivos sobre os outros quatro elementos geralmente abordados pelas psicoterapias: o ambiente (incluindo história de vida), a biologia, os afetos/emoções e o comportamento. Isto não quer dizer que os pensamentos sejam mais determinantes dos distúrbios psicopatológicos que os outros quatro aspectos acima mencionados, mas sim, que, através da modificação de padrões cognitivos distorcidos ou disfuncionais, podemos alterar os outros quatro e, consequentemente, obter uma melhora global do funcionamento de um indivíduo (Dattilio & Freeman, 1998 cita Araújo, Shinohara 2002).
A terapia cognitiva de Beck caracteriza-se por ser uma abordagem psicoterapêutica estruturada, de participação ativa entre terapeuta e cliente, voltada para o presente, que se baseia no Modelo Cognitivo e na utilização de técnicas específicas, predominantemente cognitivas e comportamentais, que visam à modificação dos padrões de pensamentos e crenças disfuncionais que causam ou mantêm sofrimento emocional e/ou distúrbios psicológicos no indivíduo. Fundamenta-se no pressuposto de que as emoções, comportamentos e reações fisiológicas estão diretamente ligados à forma como o indivíduo avalia suas experiências no mundo (Beck, Rush, Shaw & Emery, 1979). Ou seja, o modo como as pessoas interpretam as situações será determinante da maneira como ela irá se sentir, afetiva e fisiologicamente, e de como ela irá se comportar (Shinohara, Figueiredo & Brasileiro, 1999 cita Araújo, Shinohara 2002).
Segundo o modelo cognitivo, é possível identificar três níveis de cognição: os pensamentos automáticos, nível mais superficial e espontâneo que surge na mente diante de diversas situações do cotidiano; as crenças intermediárias, onde conteúdos cognitivos aparecem sob a forma de regras e suposições ligadas ao nível mais profundo, que são as crenças centrais a respeito de si mesmo, dos outros e do mundo, que se formam a partir de experiências remotas da infância (Beck, 1997 cita Araújo, Shinohara 2002). Alguns princípios são norteadores da terapia cognitivo-comportamental como um todo, ressalvando-se que esta seja adaptável a cada indivíduo particularmente. Dentre eles o de que a terapia deve basear-se em uma formulação contínua do funcionamento do cliente em termos que valorizem a relação entre situações – pensamentos – emoções – comportamentos. Além disso, toda a terapia deve assegurar uma boa relação terapêutica, que inclui, entre outros aspectos, a capacidade empática do terapeuta, uma postura de respeito, interesse e compreensão dos problemas trazidos pelo cliente para que esse possa sentir-se acolhido e atendido em suas necessidades. A partir do estabelecimento desta relação, busca-se a colaboração e participação ativa do cliente e do terapeuta na resolução dos problemas abordados através de metas voltadas para o aqui-e-agora e para a identificação, avaliação e modificação de pensamentos e crenças disfuncionais. Para atingir tais objetivos são utilizadas técnicas cognitivo-comportamentais, principalmente o registro de pensamentos, o questionamento socrático e os experimentos comportamentais (Greenberger & Padesky, 1999 cita Araújo, Shinohara 2002).
Especificamente quanto à formulação, em um de seus mais recentes trabalhos, Beck e Alford (2000) apontam para a importância desta na terapia como sendo a base para, compreendendo os conceitos pessoais que são ativados em determinadas situações que levam o indivíduo a se comportar de maneira maladaptativa ou disfuncional, fornecer estratégias para corrigir esses conceitos. Sem esta formulação o trabalho terapêutico torna-se vago e impreciso, sem saber exatamente para que e para onde se direcionar. Freeman (1998) chega mesmo a afirmar que a habilidade mais importante do psicoterapeuta é a capacidade para desenvolver conceituações de tratamento, uma vez que, mesmo com a utilização de técnicas e instrumentos de terapia cognitiva, sem a formulação o objetivo se perde. Devido à importância deste aspecto para a prática eficaz da terapia cognitivo-comportamental, a seguir é apresentada uma discussão sobre formulação de casos clínicos (Araújo, Shinohara 2002).
Importância da Formulação na terapia cognitivo-comportamental
havendo uma boa compreensão do fenômeno que está sendo apresentado, torna-se muito mais fácil o planejamento de estratégias para atingir determinados objetivos. Em outras palavras, somente através do desenvolvimento de uma boa formulação da situação ou problemas trazidos para terapia, é que se podem planejar procedimentos efetivos para alcançar as mudanças desejadas e, consequentemente, ficará mais fácil avaliar se um determinado tipo de intervenção psicológica é uma terapêutica realmente eficaz ou não (Araújo, Shinohara 2002).
Uma formulação de caso é uma teoria sobre o cliente que busca relacionar as dificuldades que ele apresenta de forma clara e significativa, integrando-as isoladamente e entre si. Procura compreender como o indivíduo desenvolveu e mantém tais dificuldades, e como ele provavelmente se comportará no futuro diante de determinadas condições. Finalmente, permite, através de uma visão ampla do funcionamento do cliente, planejar intervenções que possibilitem as mudanças necessárias e desejadas. Além disso, o processo de avaliação e formulação do caso do cliente permite o estabelecimento de uma relação terapêutica positiva e uma maior adesão dele ao tratamento (Rangé & Silvares, 2001 cita Araújo, Shinohara 2002).
Desenvolvendo uma formulação cognitivo-comportamental
O processo de coleta de dados a respeito de uma pessoa inicia-se normalmente com uma série de entrevistas posteriormente complementadas com instrumentos padronizados de avaliação e medida. Na formulação de casos infantis o terapeuta usa como referencial o mesmo modelo dos adultos, embora haja diferenças importantes na condução das entrevistas, como entrevistar necessariamente adultos significativos, e na escolha das técnicas diagnósticas, como o uso de material lúdico. Detalhes podem ser encontrados em bibliografia específica sobre formulação de casos infantis (ver Rangé & Silvares, 2001; Reinecke, Dattilio & Freeman, 1999 cita Araújo, Shinohara 2002).
Segundo Wolpe e Turkat (1985), Beck (1997) e Freeman (1998), o terapeuta deve procurar formas de, durante as entrevistas iniciais, poder ir identificando ou, pelo menos, levantando hipóteses sobre quais são os problemas atuais, como se desenvolveram e como são mantidos; que pensamentos e crenças disfuncionais estão associados a estas situações e quais são as reações emocionais, fisiológicas e comportamentais relacionadas ao pensamento; que experiências passadas contribuem para seu problema atual; que regras ou suposições podem estar subjacentes ao pensamento; que estratégias – cognitivas, afetivas e comportamentais – têm sido utilizadas para lidar com as crenças disfuncionais; e que eventos estressores contribuíram para o surgimento do problema ou inibiram o funcionamento das estratégias adaptativas (Araújo, Shinohara 2002).
Beck (1997) sugere ainda uma forma resumida de formulação, um diagrama de conceituação cognitiva, onde o terapeuta pode organizar estas questões de forma a reunir dados sobre as situações-problema típicas vivenciadas pelo cliente, seus pensamentos automáticos, emoções e comportamentos, além de estratégias comportamentais, crenças intermediárias, crenças centrais e dados relevantes da infância que, juntos, integram uma espécie de “mapa cognitivo da psicopatologia do cliente” (Araújo, Shinohara 2002).
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Referência:
ARAÚJO, Cristiane Figueiredo; SHINOHARA, Helene. Avaliação e diagnóstico em terapia cognitivo-comportamental. Interação em Psicologia, v. 6, n. 1, 2002.