Apraxia
A Apraxia pode ser entendido como o comprometimento da capacidade de realizar movimentos, gestos ou habilidades previamente aprendidos, espontaneamente e/ou ao comando, seguido de uma disfunção e/ou lesão cerebral, cujos sistemas envolvidos na execução da ação estão intactos (ausência de distúrbios motores) e com plena consciência do ato a cumprir.
A apraxia é um distúrbio que pode ser observado após a lesão neurológica em áreas supra-segmentares. É entendida como a incapacidade de executar determinados atos motores voluntários, sem que exista déficit motor ou sensitivo e o paciente tenha plena consciência do ato a cumprir. O apráxico apresenta dificuldade em realizar movimentos ao comando verbal e atos de mímica. Sendo assim, a funcionabilidade do paciente torna-se deficitária e a recuperação neuromotora, prejudicada (VAZ, FONTES, FUKUJIMA 1999).
Primeira classificação de Apraxia
Em 1908 o neurologista e psiquiatra alemão Hugo Karl Liepmann (1863-1925) fez a primeira classificação das apraxias. De maneira muito clara a definiu conforme três formas diferentes:
- Apraxia ideatória: Quando está alterada a conduta de um ato complexo da sucessão lógica e harmônica do gesto, ou seja, quando o sujeito não tem, com precisão, a representação mental do ato a executar. O psiquiatra Dr. Ajuriaguerra e colaboradores em sua escola definem em 1960 como “[…] as perturbações do gesto que se manifestam na utilização dos objetos”. Muitas vezes, esses indivíduos passam por desatentos ou desleixados. Por exemplo, a criança para quem se oferece uma bala a coloca na boca sem retirar o invólucro.
- Apraxia ideomotora: Quando o paciente tem a representação correta do ato a ser realizado, mas estão afetados os gestos simples, enquanto a sequência se mantém íntegra. Embora se comporte como deficiente, sabe-se que tem inteligência normal e clara percepção do gesto que deve realizar, mas não consegue fazê-lo, e isto o angustia muito. Por exemplo, se é oferecido algo para a criança beber, ela leva a mão até o copo, mas não o leva à boca.
- Apraxia melocinética: Quando está comprometida a relação da musculatura agonista e antagonista na realização de movimentos rápidos e alternados. Esses casos podem ser confundidos com síndromes cerebelares (ROTTA2015).
Segunda classificação de Apraxia
Em 1960 o psiquiatra e professor francês de origem espanhola Dr. Julian de Ajuriaguerra e colaboradores fizeram uma segunda classificação para o entendimento não só das apraxias, como também das dispraxias infantis (Transtorno do desenvolvimento infantil caracterizado por dificuldades motoras em crianças saudáveis). Consideraram quatro tipos diferentes:
- Apraxia sensório-cinética: Quando há comprometimento da automatização do gesto, embora o sujeito tenha pleno conhecimento do ato a realizar. É caracterizada por um atraso na aquisição da organização motora. Nesses casos, não há alteração do esquema corporal e se manifesta por gestos lentos e torpes.
- Apraxia somatoespacial: Quando há comprometimento da noção do esquema corporal, o que interfere na execução do gesto no espaço e no tempo.
- Apraxia de formulação simbólica: Quando ocorre desorganização da atividade simbólica, levando a dificuldades na planificação do ato a executar.
- Apraxias especializadas: Quando há comprometimento de uma só função ou da gestualidade de uma parte específica do corpo. Entre elas, destacam-se as apraxias faciais, que, por sua vez, podem estar centradas em gestos solicitados para o movimento da língua, da boca, dos olhos ou da fronte. Também são exemplos, entre outras possibilidades, as apraxias posturais, as da marcha, as de vestir, as construtivas e as que comprometem a grafia. Esta última forma interfere muito na aprendizagem escolar.
Ajuriaguerra e colaboradores chamam a atenção para o fato de que a criança dispráxica sabe bem o que tem que fazer e não tem dificuldades motoras para realizá-lo, mas impossibilidade de fazê-lo. Os autores comentam que não existe um só tipo de apraxia, mas muitas apraxias infantis. Eles destacam entre as dispraxias infantis:
- Alterações do desempenho motor, ligadas a dificuldades principalmente motoras;
- Dispraxia construtiva, mais frequente nas crianças sinistras (canhotas) e acompanhada, em muitos casos, de agnosia digital;
- Discinesia espacial, em que ocorre desorganização do movimento e do esquema corporal;
- Dispraxias especializadas, como a dispraxia verbal, facial, ocular e postura (ROTTA2015).
Apraxia ou dispraxia?
Na criança, as primeiras capacidades operatórias são observadas entre os 7 e 8 anos de idade. Para a criança, passou a ser usada a expressão dispraxias, porque se trata, como nas disfasias e disgnosias, de um transtorno do desenvolvimento, no caso, da gestualidade. Nas dispraxias, ocorre alteração no desenvolvimento do gesto, que é realizado em relação ao próprio corpo ou ao mundo dos objetos, relacionado a uma intenção (ROTTA2015).
Critérios Diagnósticos para Dispraxia
O DSM–5 traz as dispraxias como transtorno do desenvolvimento da coordenação, com o CID F82, considera as denominações dispraxia da infância, transtorno do desenvolvimento e específico da função motora e síndrome da criança desajeitada.
A) A aquisição e a execução das habilidades motoras coordenadas estão substancialmente abaixo do esperado para a idade cronológica e a oportunidade de aprender e usar a habilidade. As dificuldades manifestam-se por falta de jeito (p. ex., derrubar ou bater em objetos), bem como por lentidão e imprecisão no desempenho de habilidades motoras (p. ex., apanhar um objeto, usar tesouras ou facas, escrever à mão, andar de bicicleta ou praticar esportes).
B) O déficit nas habilidades motoras do critério A interfere significativa e persistentemente nas atividades cotidianas apropriadas para a idade (p. ex., autocuidado e automanutenção), causando impacto na atividade acadêmica/escolar em atividades pré-profissionais, profissionais, no lazer e nas brincadeiras.
C) O início dos sintomas ocorre precocemente no período do desenvolvimento.
D) O déficit nas habilidades motoras não são mais bem explicados por deficiência intelectual ou por deficiência visual e não são atribuíveis a alguma condição neurológica que afete os movimentos (p. ex., paralisia cerebral, distrofia muscular ou doença degenerativa).
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Referências:
ROTTA, Newra Tellechea; OHLWEILER, Lygia; DOS SANTOS RIESGO, Rudimar. Transtornos da aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Artmed Editora, 2015.
VAZ, Elaine Roberta; FONTES, Sissy Velosos; FUKUJIMA, Marcia Maiumi. Testes para detecção de apraxias por profissionais da saúde. Revista Neurociências, v. 7, n. 3, p. 136-139, 1999.
Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais [recurso eletrônico] : DSM-5 / [American Psychiatric Association ; tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento … et al.] ; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli … [et al.]. – 5. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2014.